Com exibições presenciais e on-line, "A Idade da Peste" estreia na Oficina Cultural Oswald de Andrade
Foto: Nelson Kao
O que aconteceria se uma mulher branca de classe média alta realmente se descobrisse branca? A que custo isso se daria, e qual o discurso possível dessa constatação? Foi a partir dessa provocação que o dramaturgo Reni Adriano e a atriz Cácia Goulart conceberam o solo em formato audiovisual A idade da peste, que estreia com exibições presenciais na Oficina Cultural Oswald de Andrade.
Em cena, Senhora C. assiste ao assassinato do filho da empregada, encurralado pela polícia, dentro da sua casa de classe média alta. O episódio desencadeia um profundo exame de consciência em que os desejos inconfessados da branquitude emergem como um marcador racial aterrorizante, questionando a própria possibilidade de justiça em um mundo feito à imagem e semelhança dos brancos.
Mas engana-se quem espera da atuação de Cácia Goulart uma personagem branca se autoelogiando como “antirracista” ou performando mea culpa e comiseração. “Senhora C. não tem esse complexo de Princesa Isabel; não pretende ser reconhecida como a ‘branca redentora’ da causa. Pelo contrário: ela é consciente da infâmia do lugar racial que ocupa, sabe que esse lugar é indefensável”, reflete Cácia, que também assina a direção da peça. Para ela, o risco da abordagem pelo viés escolhido seria a tentação de redimir a personagem, ou cobri-la de elogios por sua consciência racial. “Mas a desgraça dela é saber que não basta ter consciência: ela está, como branca, submersa na indignidade, uma vez que reconhece seu lugar na branquitude, mas é incapaz de desocupar esse lugar privilegiado”, conclui.
Para o dramaturgo Reni Adriano, esse assunto costuma ser violentamente rechaçado por pessoas brancas, porque instintivamente reconhecem que subjaz a esse tema-tabu uma dose dolorosa de vergonha e infâmia. “Mas o status da branquitude se perpetua e se atualiza justamente nesse silenciamento”, pondera. Além disso, o autor, que é negro, ironiza que escrever para uma atriz branca funcionaria como uma espécie de mascaramento para que brancos possam ouvi-lo de boa vontade. “O fato de sermos um país em que negros não têm um dia sequer de descanso só é possível ao preço de que os brancos tenham uma dignidade muito frágil. Eu quero questionar essa dignidade frouxa dos brancos. Debater racismo com negros é fácil; o que eu quero é racializar os brancos em cena e situá-los no lugar de suas responsabilidades”, crava.
Foto: Nelson Kao
Escrita por um dramaturgo negro, portanto, para atuação de uma atriz branca, a peça mobiliza e tensiona os marcadores identitários raciais de modo a evidenciar que, antes de ser um “problema de negros”, o racismo é um flagelo de brancos. O exercício de franqueza de uma mulher branca sobre a perversão de seu próprio status identitário torna A idade da peste uma assombrosa reflexão em que pensar o racismo é um debate sobre o mal.
E para aprofundar o debate na urgência exigida pelo tema, a estreia conta com quatro convidados especiais. A exibição presencial do dia 17 de dezembro será seguida de uma conversa com o poeta e dramaturgo Rudinei Borges e o jornalista e crítico Valmir Santos, do Teatrojornal. Já a exibição on-line do dia 20 de dezembro contará com as apreciações do escritor e dramaturgo Allan da Rosa e da jornalista e colunista do The Intercept Brasil Fabiana Moraes.
O projeto foi contemplado pelo edital ProAC Expresso LAB 47/2020
Foto: Nelson Kao
SINOPSE
Uma mulher branca assiste ao assassinato do filho da empregada, acossado pela polícia, dentro da sua casa de classe média alta. O episódio desencadeia um profundo exame de consciência em que os desejos inconfessados da branquitude emergem como um marcador racial aterrorizante, questionando a própria possibilidade de justiça em um mundo feito à imagem e semelhança dos brancos. Escrito por um dramaturgo negro para atuação de uma atriz branca, a peça mobiliza e tensiona os marcadores identitários raciais de modo a evidenciar que, antes de ser um “problema de negros”, o racismo é um flagelo de brancos. O exercício de franqueza de uma mulher branca sobre a perversão de seu próprio status identitário torna A idade da peste uma assombrosa reflexão em que pensar o racismo é um debate sobre o mal.
Ficha Técnica
Texto: Reni Adriano
Direção e Atuação: Cácia Goulart
Voz off (Senhor R.): Samuel de Assis
Assistente de Direção: Edmilson Cordeiro
Preparadora de ator e Colaboradora: Inês Aranha
Direção de arte: Cácia Goulart
Produção musical - Sound design: Marcelo Pellegrini
Design Banheira: Joaquim Goulart
Captação de imagem e Direção de fotografia: Nelson Kao
Edição: FVFilmes
Direção de Produção: Cácia Goulart
Assistente de Produção/Gravação: Edmilson Cordeiro
Realização: NÚCLEO CAIXA PRETA da Cooperativa Paulista de Teatro
A IDADE DA PESTE
Duração: 75 minutos
Classificação: 16 anos
Gratuito
Exibições presenciais:
Cineclube da Oficina Cultural Oswald de Andrade
• Dia 17 de dezembro, às 19h
(seguida de debate com os convidados Rudinei Borges e Valmir Santos)
• Dia 18 de dezembro, às 18h
Endereço: Rua Três Rios, 363 – Bom Retiro – São Paulo/SP
Lotação: 30 lugares (Retirada dos ingressos com 01 hora de antecedência)
(Entrada permitida somente com o uso de máscara cobrindo nariz e boca. Durante a permanência no local, siga os protocolos sanitários para prevenção da Covid-19)
Exibições On-line - PARTE I:
• Dia 20 de dezembro, às 20h
(seguida de debate com os convidados Allan da Rosa e Fabiana Moraes)
• Dias 21 e 22 de dezembro, às 20h
Local: Youtube das Oficinas Culturais do Estado de São Paulo
Exibições On-line - PARTE II:
• De 23 a 30 de dezembro de 2021, às 16h e às 20h
Local: Youtube Cacia Goulart
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